quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Sobre amizades


"As melhores amizades você vai fazer na faculdade".
Ouvi essa frase a minha vida toda e a levei comigo como uma verdade absoluta. E adivinha só? Não é. Se saí da faculdade com dois amigos verdadeiros é muita coisa e mesmo assim ainda me pego com um pé atrás de vez em quando. Passei 2019 inteiro me perguntando se o problema era eu, eles ou o curso de Direito (já que estudantes de Direito são chatos e competitivos para cacete). Não fiz amizades para vida toda, não tive um grupinho e não eternizei momentos épicos. Na verdade, tive tantos problemas de amizade na faculdade que comecei a me questionar se é mesmo possível fazer amigos verdadeiros quando viramos adultos, porque quanto mais velhos ficamos parece que é cada vez mais difícil.
Os amigos que tenho, que são bem poucos, eu fiz na época da escola e depois deles não tive mais nenhuma outra pessoa que eu pudesse chamar de "amiga". Apenas colegas de momento, de conveniência, de interesse. Coisas extremamente passageiras e superficiais.
Por que a medida em que crescemos fica tão difícil achar amigos? Deveria ser mais fácil. Já estamos mais experientes, espertos, já sabemos o que nos agrada e o que nos incomoda, já sabemos o tipo de pessoa que queremos perto e o tipo que queremos bem longe. E talvez essa seleção seja o problema. Depois da escola não dá mais para aturar fofocas, intrigas, exclusão, indiretas, brigas por notas, brigas por quem fez mais e quem fez menos nos trabalhos, brigas por causa de homem que não é de ninguém, brigas porque fulano interpretou mal a sua fala, brigas porque te acusaram de ter feito algo que ninguém tem provas e mesmo assim continuam acusando. Brigas, brigas e brigas. É cansativo. Se eu conto algo para fulano e ele conta para outra pessoa, eu já corto. Se fulana fica de mal porque o cara que ela tava afim me manda mensagem, eu já corto. Se fulano já sai acreditando em alguma coisa que falaram sobre mim sem nem mesmo me ouvir ou me contar, eu já corto. Se o grupinho que eu ando sempre se reúne e nunca não me convida, mas lembra de mim na hora quando tem dúvida em Direito Penal, eu já corto.
E assim vão acabando as meras expectativas de amizade. Vamos cortando tudo que faz mal, tudo que não combina, tudo que parece errado até que nada mais sobra. Não é errado cortar. Não tem como chamar de amigo pessoas que te fazem mal de alguma forma, seja num detalhe mínimo ou numa grande catástrofe.
A questão é que mesmo sabendo que estou preservando minha saúde mental me afastando de pessoas tóxicas, ainda sim é difícil não se sentir sozinha e até mesmo rejeitada. Terminei a faculdade com essa sensação ridícula de rejeição, querendo achar alguém para perguntar "ei, cadê os amigos que iam ser para vida toda?". Cadê os amigos para planejar ser sócios de um escritório de advocacia, para estudar para concurso juntos, para fazer reuniões da turma pelo menos uma vez no ano? 
Eles não estão no meu álbum de formatura.
Tenho apenas duas fotos com duas colegas da minha turma no álbum. 
E no restante das fotos estão os amigos que até então eu não tinha me tocado de que são meus amigos.
A Carla, amiga da minha mãe, é minha amiga. Ela sempre me manda mensagem, tem o abraço mais carinhoso e me dá toda liberdade do mundo para conversar sobre qualquer coisa.
A Dai, que trabalha na loja da minha família há anos, é minha amiga. Ela está em todos os eventos, sempre vibrando e torcendo por mim da forma mais sincera eu já vi.
Minhas primas, Nayara e Larissa, são minhas amigas. Nem se quer somos família de sangue, mas o amor que nos liga é muito mais forte. A Larissa sempre tomando meu partido em todas as brigas, sem nunca me deixar desprotegida. A Nayara, que apesar de tantas vezes tentarem impor aquela competição desnecessária entre nós, nunca nos separamos e em todas as situações somos companheiras, até mesmo nas diferenças e nas discordâncias somos amigas.
A Ana Luíza e a Jac são minhas amigas. Vieram do outro lado do país só para comemorar minha formatura comigo. São tantos anos de amizade que já se incorporaram na minha vida como família. E ser amiga delas é falar besteiras, é rir de tudo que não tem graça, é mostrar nosso lado feio e mesmo assim ser acolhida, é ter histórias para contar, é tomar as dores como se fossem nossa.
Meu padastro (meu pai) é meu amigo. É amar incondicionalmente, cuidar, se importar, estar presente, torcer e carregar alguém que você não tinha obrigação de nada, mas escolheu adotar.
Meu namorado é meu amigo. É aquele que me deu de presente o livro que eu usei para estudar para OAB, que dirigiu por quatro horas só para me levar até a cidade onde a minha irmã ia fazer uma cirurgia inesperada de apêndice, que tirou minha maquiagem e me colocou para dormir quando eu dei PT pela primeira vez, que me deu aquele curso que eu queria de aniversário mesmo que isso signifique ter menos tempo para ele.
Minha irmã é minha amiga. Até mesmo quando ela não gosta de mim, eu sei que se eu precisar ela vem e se alguém me atacar, ela me defende.
Meu pai é meu amigo. É o cara que ensinou tudo que eu sei, é quem me deu direção, é quem me ajudou a me encontrar, é quem nunca duvidou do meu potencial, é quem me deu apoio quando eu disse que queria estudar para concurso invés de advogar, é quem me liga sempre que tem um tempinho e me escuta quando eu preciso.
Minha avó paterna é minha amiga. É a amiga que me contava histórias para dormir, que me abraçou todas as vezes que eu chorei, que segurou minha mão quando eu tive medo, que viu todas as novelas da SBT comigo, que fazia minha comida preferida quando eu ia visitá-la e que, mal sabia eu, quando ia fazer sua reza da tarde no seu lugarzinho especial sempre me colocou em suas orações.
E minha mãe é a minha melhor amiga. A amiga que me conhece com a palma da mão, pelo olhar, pela voz. A amiga que sabe ler meu pensamentos, que sabe o chocolate que eu gosto, a minha cor preferida e meus hábitos estranhos. Foi quem me deu meu primeiro livro, quem leu a primeira coisa que eu escrevi, quem viajou comigo quando eu fui fazer meu primeiro concurso. Foi quem me disse que o problema de tantas coisas derem errado não sou eu. Foi quem me amou em todos os instantes por vinte e três anos e durante as vinte e quatro horas do dia.
Acho que passamos muito tempo procurando amigos nos lugares errados, em pessoas erradas, com uma visão errada do que é ser amigo, com um conceito ultrapassado e limitado do que é amizade.
Você nem se quer precisa ir muito longe para encontrar um amigo, porque os amigos de verdade sempre estiveram presente, só estavam disfarçados com outros nomes. 
E essas sim, são as melhores amizades.


Por Ridrya Carolin