domingo, 7 de janeiro de 2024

Um tanto mais de nós dois


Ele tinha um gosto familiar.
Era confortável, amigável, gentil. Era cativante, vivo e manso. Era a simplicidade da rotina, era alegria de coisa simples, sobremesa antes do almoço, era sol de início de dia, cor de fim de tarde, cheiro de casa limpa, descanso depois de um dia cheio.
Ele sabia ser domingo. Simples, preguiçoso, monótono e livre. Era descanso e sabia dar descanso. Era leve e sabia dar leveza.
Ele sabia ser feliz e fazer feliz. Era pizza num sábado a noite vendo filme jogados no sofá, era comer pastel na feirinha sábado de manhã, era brincar de implicar, era dançar sem música. Era rir e saber fazer rir.
Ele sabia ser e sabia deixar ser. Era liberdade de coisas simples. Liberdade de contrariar, de desagradar e até desgostar. Liberdade de gostar do que gosta, de falar o que pensa e de fazer sem pensar. Ele era quem é e me deixava ser. Ele sabia quem eu era e deixava eu me gostar.
Ele era amor e sabia amar. Às vezes de um jeito torto, um pouco inseguro, meio brusco, mas, no fim, sabia me amar. 
No fim do dia, deixava eu me amar. Às vezes de um jeito confuso, exigente e insatisfeito, mas ainda sim era um amor imenso só de deixar. Tão simples, profundo e sem rédeas. Tão sem incômodos, leve e solto.
Eu demorei pra ver. Eu tive que cair pra entender. Eu tive que te perder pra saber. Eu tive que me perder pra reconhecer. Eu tive que ser sozinha, presa e quebrada pra ver que um amor para amar só precisa deixar ser e com você eu fui e ainda sou. Eu pude ser eu e fui amada só por ser. Tão simples, tão comum, tão raro.
Eu tive que te encontrar de novo no começo de tudo pra driblar esse fim vestido de nadas e desencontros. Tive que ir na nossa rua, passar em frente daquela esquina, voltar para o lugar onde nossos passos escreveram nossa história para implorar por mais espaços em branco. Um tanto mais só pra gente ter liberdade de ser um tanto mais juntos.
E ali no começo de tudo e diante de tanto fim, eu pedi um tanto mais de nós. E pedi também um tanto mais de força para as circunstâncias não nos achar, o tempo não nos tocar e todos os contras não nos ver.
Bem ali no lugar onde eu te conheci, eu me lembrei do teu cheiro, do teu som, do teu gosto.
Tu tinha um gosto familiar.
Eu demorei anos para reconhecer até que eu soube.
Tu tinha um gosto familiar de abrigo, de casa, de lar.

Para ler ouvindo: Chão de Giz - Zé Ramalho

Por Ridrya Queiroz

quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Um amor incômodo

 


Eu vejo o incômodo sentado no sofá no meio de nós dois.
Eu o vejo olhando pra mim. Ele acena, ele me toca e até me arranha. Ele quer ser notado, quer que eu olhe de volta, quer que eu o veja. 
E, às vezes, eu acho até que ele quer que eu o reconheça.
Eu ouço o incômodo em cada palavra que você fala. 
Ele me atinge tão forte que me embrulha o estômago, para minha respiração, sufoca e me deixa inquieta. Ele é mudo, mas grita no meu ouvido toda vez que a tua opinião atropela a minha, que as tuas crenças questionam a educação que me criou, que o teu julgamento me empurra e me esmurra na parede. Em silêncio, eu ouço tão claramente o incômodo gritar toda vez que a tua honra derruba o meu valor e a tua seriedade julga a moral da minha empatia. 
Eu absorvo todos os dias as tua palavras, eu engulo no seco os teus pensamentos e as tua regras. Eu só ouço você no dia dia e te ouvir botou em cheque tudo que eu sabia. Fez eu mudar de comportamento, me obrigou a procurar o erro nas outras, me induziu a achar o erro em mim. Eu conto meus passos, eu abaixo os olhos, eu troco um pouco menos que uma dúzia de palavras com os outros em volta. Eu reduzo minha fala e me prendo dentro de casa.
A mulher que me habita, a dona dos livros da minha estante, a garota no porta retrato, os amigos de infância, os estranhos da rotina, os parentes distantes, a velha da padaria, a delegada, a filha. Nada mais me reconhece. Ninguém mais me conhece. Eu mesma me estranho e não me suporto. E tento tão desesperadamente mudar de forma, de cor, de peso só para ser do teu gosto, só para me encaixar na lista de verificação que você criou, pra ser do padrão que você disse que é o certo.
Para ser amada por você eu fiz concessões, eu cedi detalhes, troquei toda minha base, me encolhi para caber na sua vida. Para amar você, eu invalidei todo o resto porque fui constantemente invalidada pelo teu todo.
Então, eu me pergunto tão perdida e desesperada, tão presa e já tão apagada, tão doente, dormente e dopada: por que eu continuo aqui alimentando um amor incômodo?
Um amor que incomoda meu ser, minha família, meus amigos, meu passado, meu querer, meu gostos, meu futuro.
Um amor que faz eu não me gostar, que fez eu me odiar, que faz eu me esconder, que insiste em me apagar e, às vezes, até pede para de pouco em pouco eu me matar.
Então, eu me pergunto já tão sozinha, já tão sem ninguém, já tão sem a pessoas que eu afastei, já tão sem os amigos que eu cansei: por que eu continuo aqui alimentando um amor que tanto se incomoda?
Um amor que se incomoda com o meu ser, com a minha família, meus amigos, meu passado, meu querer, meu gostos e meu futuro.
Por que eu vivo dentro desse amor tão incômodo?
E, de repente, de modo rápido, em tantos meses e tantos dias depois tudo que me resta é o que você me ofereceu e eu involuntariamente aceitei. A única coisa que você soube retribuir. A única coisa que você podia me dar. A única coisa que você tinha e era capaz de me entregar. Um amor incômodo que me tolera, me anula, me acaba e, até mesmo, entre falas e silêncio, me mata.
Eu sento e te observo.
E, no mesmo sofá, entre nós dois, sempre tem ele.
E nunca, em nenhum momento, desde o começo, desde o primeiro beijo, nunca ficamos a sós.

quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Sobre amizades


"As melhores amizades você vai fazer na faculdade".
Ouvi essa frase a minha vida toda e a levei comigo como uma verdade absoluta. E adivinha só? Não é. Se saí da faculdade com dois amigos verdadeiros é muita coisa e mesmo assim ainda me pego com um pé atrás de vez em quando. Passei 2019 inteiro me perguntando se o problema era eu, eles ou o curso de Direito (já que estudantes de Direito são chatos e competitivos para cacete). Não fiz amizades para vida toda, não tive um grupinho e não eternizei momentos épicos. Na verdade, tive tantos problemas de amizade na faculdade que comecei a me questionar se é mesmo possível fazer amigos verdadeiros quando viramos adultos, porque quanto mais velhos ficamos parece que é cada vez mais difícil.
Os amigos que tenho, que são bem poucos, eu fiz na época da escola e depois deles não tive mais nenhuma outra pessoa que eu pudesse chamar de "amiga". Apenas colegas de momento, de conveniência, de interesse. Coisas extremamente passageiras e superficiais.
Por que a medida em que crescemos fica tão difícil achar amigos? Deveria ser mais fácil. Já estamos mais experientes, espertos, já sabemos o que nos agrada e o que nos incomoda, já sabemos o tipo de pessoa que queremos perto e o tipo que queremos bem longe. E talvez essa seleção seja o problema. Depois da escola não dá mais para aturar fofocas, intrigas, exclusão, indiretas, brigas por notas, brigas por quem fez mais e quem fez menos nos trabalhos, brigas por causa de homem que não é de ninguém, brigas porque fulano interpretou mal a sua fala, brigas porque te acusaram de ter feito algo que ninguém tem provas e mesmo assim continuam acusando. Brigas, brigas e brigas. É cansativo. Se eu conto algo para fulano e ele conta para outra pessoa, eu já corto. Se fulana fica de mal porque o cara que ela tava afim me manda mensagem, eu já corto. Se fulano já sai acreditando em alguma coisa que falaram sobre mim sem nem mesmo me ouvir ou me contar, eu já corto. Se o grupinho que eu ando sempre se reúne e nunca não me convida, mas lembra de mim na hora quando tem dúvida em Direito Penal, eu já corto.
E assim vão acabando as meras expectativas de amizade. Vamos cortando tudo que faz mal, tudo que não combina, tudo que parece errado até que nada mais sobra. Não é errado cortar. Não tem como chamar de amigo pessoas que te fazem mal de alguma forma, seja num detalhe mínimo ou numa grande catástrofe.
A questão é que mesmo sabendo que estou preservando minha saúde mental me afastando de pessoas tóxicas, ainda sim é difícil não se sentir sozinha e até mesmo rejeitada. Terminei a faculdade com essa sensação ridícula de rejeição, querendo achar alguém para perguntar "ei, cadê os amigos que iam ser para vida toda?". Cadê os amigos para planejar ser sócios de um escritório de advocacia, para estudar para concurso juntos, para fazer reuniões da turma pelo menos uma vez no ano? 
Eles não estão no meu álbum de formatura.
Tenho apenas duas fotos com duas colegas da minha turma no álbum. 
E no restante das fotos estão os amigos que até então eu não tinha me tocado de que são meus amigos.
A Carla, amiga da minha mãe, é minha amiga. Ela sempre me manda mensagem, tem o abraço mais carinhoso e me dá toda liberdade do mundo para conversar sobre qualquer coisa.
A Dai, que trabalha na loja da minha família há anos, é minha amiga. Ela está em todos os eventos, sempre vibrando e torcendo por mim da forma mais sincera eu já vi.
Minhas primas, Nayara e Larissa, são minhas amigas. Nem se quer somos família de sangue, mas o amor que nos liga é muito mais forte. A Larissa sempre tomando meu partido em todas as brigas, sem nunca me deixar desprotegida. A Nayara, que apesar de tantas vezes tentarem impor aquela competição desnecessária entre nós, nunca nos separamos e em todas as situações somos companheiras, até mesmo nas diferenças e nas discordâncias somos amigas.
A Ana Luíza e a Jac são minhas amigas. Vieram do outro lado do país só para comemorar minha formatura comigo. São tantos anos de amizade que já se incorporaram na minha vida como família. E ser amiga delas é falar besteiras, é rir de tudo que não tem graça, é mostrar nosso lado feio e mesmo assim ser acolhida, é ter histórias para contar, é tomar as dores como se fossem nossa.
Meu padastro (meu pai) é meu amigo. É amar incondicionalmente, cuidar, se importar, estar presente, torcer e carregar alguém que você não tinha obrigação de nada, mas escolheu adotar.
Meu namorado é meu amigo. É aquele que me deu de presente o livro que eu usei para estudar para OAB, que dirigiu por quatro horas só para me levar até a cidade onde a minha irmã ia fazer uma cirurgia inesperada de apêndice, que tirou minha maquiagem e me colocou para dormir quando eu dei PT pela primeira vez, que me deu aquele curso que eu queria de aniversário mesmo que isso signifique ter menos tempo para ele.
Minha irmã é minha amiga. Até mesmo quando ela não gosta de mim, eu sei que se eu precisar ela vem e se alguém me atacar, ela me defende.
Meu pai é meu amigo. É o cara que ensinou tudo que eu sei, é quem me deu direção, é quem me ajudou a me encontrar, é quem nunca duvidou do meu potencial, é quem me deu apoio quando eu disse que queria estudar para concurso invés de advogar, é quem me liga sempre que tem um tempinho e me escuta quando eu preciso.
Minha avó paterna é minha amiga. É a amiga que me contava histórias para dormir, que me abraçou todas as vezes que eu chorei, que segurou minha mão quando eu tive medo, que viu todas as novelas da SBT comigo, que fazia minha comida preferida quando eu ia visitá-la e que, mal sabia eu, quando ia fazer sua reza da tarde no seu lugarzinho especial sempre me colocou em suas orações.
E minha mãe é a minha melhor amiga. A amiga que me conhece com a palma da mão, pelo olhar, pela voz. A amiga que sabe ler meu pensamentos, que sabe o chocolate que eu gosto, a minha cor preferida e meus hábitos estranhos. Foi quem me deu meu primeiro livro, quem leu a primeira coisa que eu escrevi, quem viajou comigo quando eu fui fazer meu primeiro concurso. Foi quem me disse que o problema de tantas coisas derem errado não sou eu. Foi quem me amou em todos os instantes por vinte e três anos e durante as vinte e quatro horas do dia.
Acho que passamos muito tempo procurando amigos nos lugares errados, em pessoas erradas, com uma visão errada do que é ser amigo, com um conceito ultrapassado e limitado do que é amizade.
Você nem se quer precisa ir muito longe para encontrar um amigo, porque os amigos de verdade sempre estiveram presente, só estavam disfarçados com outros nomes. 
E essas sim, são as melhores amizades.


Por Ridrya Carolin

sábado, 18 de maio de 2019

Não me deixa passar em branco



Isso tudo é culpa sua, sabia?
Eu estava quieta no meu canto. Eu estava indiferente a tudo que te diz respeito. Eu tinha largado mão da idiotice que era querer você.
Eu já tinha me conformado com o fato de que nós dois íamos passar em branco, batidos um pelo o outro e meio que despercebidos.
Então, adivinha o que acontece? Você volta com aquele mesmo sorriso alegre e o olhar sem vergonha que me desestabiliza. E eu fico aqui me contorcendo por dentro, lutando contra essa vontade louca de te tocar, de te falar tudo que tá engasgado aqui dentro durante anos.
Você despertar em mim o meu lado mais perigoso e pervertido, e não tenho nenhum pingo de vergonha em admitir isso. Eu me sinto a flor da pele sem nem mesmo ter sido tocada por você. Eu me sinto em chamas só de pegar teu olhar em mim, me despindo devagar.
Essa atração que nos liga é inevitável e tão intensa que me consome. E, de repente, eu sinto uma prazer enorme em brincar com o fogo e mais prazer ainda em me queimar.
A gente se quer demais para deixar passar em branco, garoto.
Então chega de brincar de esconde-esconde, chega de indiretas, chega de exigir de mim uma iniciativa que eu não tenho e não sei tomar. Chega de achar que eu vou te dar um não pela burrada que estamos prestes a fazer. Chega de achar que o meu jeito certinho vai me impedir de te ter. Chega de suposições, medo e receio. Eu não sou mais aquela garotinha que você conheceu três anos atrás, eu não me assusto e nem desisto fácil. Faz anos que estamos nos observando, nos devorando, nos provocando e não fazendo nada.
Essa é a nossa última chance.
É agora ou nunca porque eu tô indo embora e você vai ficar.
Não me deixe passar em branco, garoto.
Eu ainda tô aqui, aceitando ser tua pequena nem que seja só por algumas horas. Apenas um dia, apenas uma hora, um instante. Qualquer coisa é melhor que nada. Depois de tanto querer guardado, mata a tua vontade, mata a minha curiosidade. Me toma, me doma, me tenha. Eu prometo não me comportar, não te obedecer, não me conter.
Antes que o ano acabe, deixa a gente se amar um pouquinho as escondidas, no banco de trás do teu carro, debaixo das cobertas da minha cama. Deixa a tua boca calar a minha, teu perfume se misturar no meu, teu corpo provar o meu. Deixa eu enlaçar as pernas em volta da tua cintura, deixa eu sentar no teu colo, deixa eu arrancar tua blusa. Deixa tua voz falar besteira no meu ouvido, deixa eu sussurrar de volta.
Me deixa ser tua. Se deixa ser meu. Deixa a gente se ter.
E se for errado? Eu já não quero mais nem saber.
A gente se quer demais, garoto. Então não me deixa passar em branco.


Por Ridrya Carolin

sábado, 17 de março de 2018

No tempo antes de você


Me ensina a te desquerer?
Me ensina a não te gostar, a não pensar em você assim com tanta frequência, a não querer te ver a todo tempo e a não sentir sua falta a cada segundo. Mata esse enorme carinho que eu tenho por ti de dentro de mim, arranca pela raiz toda alegria que o teu olhar me causa, corta esse nó que nos amarra, que prende e sufoca. Acaba de uma vez com a farsa que nós somos, tira a tua máscara e eu tiro o meu disfarce.
Você é meu mal vestido de bem, é meu erro dando um de certo, é meu castigo fingindo ser aventura. Você era perigoso e, mesmo assim, em ti eu me joguei de cabeça. Você disse que eu era sua preferida, e eu, sem consentir, aceitei essa posição. 
Eu te quero por teimosia, cisma, idiotice. E você me quer por quê? Pelo o que? Ego, distração, para somar ainda mais a tua coleção? Eu não sei qual o nosso proposito e nem porque de repente existimos um para o outro em um mar de possibilidades melhores e certeiras. 
E enquanto eu te vejo, indo e vindo, sem saber o que quer ou o que fazer, eu só queria voltar no tempo em que eu te olhava e não te enxergava. No tempo em que a tua voz não era reconhecida, tua ausência não era sentida e eu não me deixava influenciar pelo poder que eu te ensinei a ter sobre mim. No tempo em que eu sabia o meu caminho, sabia para onde voltar e com quem ficar. 
O tempo antes de você, hoje em dia, parece utopia. E te querer é o pecado que eu pago enquanto morro lentamente um pouco mais a cada dia. 
E o que mais me dói é o que eu vejo enquanto você não me enxerga. 
Lá de longe, eu te pego olhando para ela. 
Pelas minhas costas, eu te vejo olhando para ela. E eu entendo o teu olhar, eu sei o que vem dele, o que se esconde nele. Você a quer por pura teimosia, cisma, idiotice. 
Esse tempo todo, teus olhos não enxergavam, não captavam, não preservavam só a mim. E me pego me comparando a ela e a qualquer outra que apareça, tentando entender o que não tem explicação: o homem que ver todas e não enxerga nenhuma.
Eu sou a tua preferida, mas ela existe e todas as outras também. E eu desapareço na multidão que você reuniu nas tuas dependências. Eu fico invisível, eu me perco, me parto e morro aos poucos mais um vez e depois de novo.
No tempo antes de você eu era mais esperta, mais experiente e safa. Eu teria te chutado antes de você aprender a se abrigar em mim. Eu teria te calado antes de você me roubar a voz. Eu teria reagido antes de você me imobilizar e gritado antes de você beijar. Eu teria sido dura feito pedra se você não tivesse descoberto a fragilidade que em mim habita as escondias por debaixo dos meus espasmos e feridas. Eu teria sido fria se teu corpo não tivesse invadido o meu e me aquecido. E, o mais importante, eu teria sido a mulher que te ver, mas não te enxerga, se você não tivesse me envolvido em um romance que só existe as escondidas por de trás dos becos, muros e avenidas.
No tempo antes de você, eu não teria cometido o erro de aceitar ser a tua preferida, quando eu deveria ter sido, desde o inicio, nada menos que a tua escolha.

Para ler ouvindo: I Don't Want To Talk About It - Fernanda Takai

Por Ridrya Carolin

quinta-feira, 15 de março de 2018

Não seja um dos porquês


Finalmente terminei os 13 episódios e a única coisa que posso falar é que SIM, essa é sim uma série inovadora, de tirar o fôlego e que finalmente abordou assuntos de forma explícita até então evitados ou deixados de lado por serem desagradáveis e, até certo ponto, perigosos. 

Apesar de suicídio ser a premissa da série, esse não é o foco. O foco são as razões que levaram Hannah a cometer suicídio. 
O que levaria uma garota bonita, divertida e confiante a tirar a própria vida? 
Não foram 13 razões que levaram Hannah a se suicidar, foi uma mistura de motivos, aparentemente, pequenos que vão se transformando em motivos grandes que se fundem no decorrer da trama. No começo, Hannah até ignora e consegue lidar com tais motivos, até que a mistura de todos eles ficam maior do que ela pode suportar e a garota bonita, divertida e confiante se transforma em uma garota triste, solitária e depressiva. Hannah, mesmo em silêncio, pedia ajuda, pedia compreensão, pedia um abraço. E lidar com tudo que ela passou sozinha, imagino eu, seja demais para uma garota de 17 anos suportar. Numa hora ou outra, tudo que ela estava guardando dentro de si iria explodir. 
O que devemos aprender com isso? Primeiro, as coisas pequenas importam SIM. Você nunca sabe como alguém vai reagir a tal brincadeira ou comentário "inocente". E a pessoa tem todo o direito de não gostar e se magoar. Segundo, depressão não é drama. Ninguém se machuca para chamar atenção, mas para que alguém preste atenção e estenda a mão para ajudar. Terceiro, você não tem a obrigação de gostar de alguém, mas tem a obrigação de respeitar. E, com certeza, não tem o direito de julgar alguém por não entender e discordar da pessoa. Cada um é cada um. Cada um sente, lida e expõem de formas diferentes. Não existe um padrão, nem um certo ou um errado. 
Não quero dizer que Hannah estava certa, porque ela não estava. Suicídio nunca será solução, nem mesmo deveria passar pela cabeça de alguém cometer tal ato. Mas Hannah tinha suas razões e, mesmo que você considere alguma delas irrelevantes e fúteis, ela sentia a dor que cada um dos 13 porquês causava nela. 
Talvez você se identifique com as razões da Hannah, talvez as razões dela não se pareçam em nada com as suas, talvez você não entenda ou talvez entenda melhor do que qualquer um. 
A questão aqui é: treine a sua compaixão, a sua solidariedade, o seu altruísmo. Comece pela Hannah, uma personagem fictícia. Não a julgue, não a descrimine, não a condene, não faça pouco dela. E, quem sabe, um dia você salve uma Hannah na vida real ou salve a Hannah dentro de você. 
Pais, prestem mais atenção em seus filhos. Educadores, prestem mais atenção em seus alunos. E pessoas em geral, não deem ouvidos, não inventem, não repassem fofoca. Não sejam preconceituosos, machistas e abusivos. Não abracem o que é diferente como algo ruim por não ser igual a você. 
Você não tem obrigação de entender ou gostar, mas tem obrigação de respeitar.
NÃO SEJA UM DOS PORQUÊS!

Por Ridrya Carolin

sábado, 3 de fevereiro de 2018

Uma casa com cerquinha branca


De vez em quando você solta a reclamação do porquê eu nunca escrevi nada para você. E, como sempre, eu te olho com aquela cara de paisagem tentando disfarçar minha confusão porque eu também não sei. 
Você brinca ao dizer que é porque eu não te amo de verdade e, sincera, eu nego essa afirmação mentirosa, mas preciso confessar que eu também me espanto com essa falta de inspiração e essa secura de palavras para falar de você. Eu sempre soube tão bem como explicar o que sinto, como descrever pessoas, como inventar momentos e histórias. 
Então, eu entendi. Eu sempre fui boa em falar sobre um amor inventado, irreal, sobre pessoas quase inexistentes, sobre coisas que nunca passei, frases que nunca disse e momentos que nunca vivi. 
Não consigo escrever sobre você porque você é meu amor real. 
Você não é só mais um personagem que eu criei, você existe. O que eu sinto é tão real que eu não sei escrever, porque eu não inventei nada disso. Eu não tenho o controle. 
E como eu posso entender algo que eu nunca escrevi, a minha realidade? Você não é coisa da minha cabeça, não é só um sonho. Você é coisa do meu coração, é parte da minha vida. E eu não sei como escrever sobre esse amor que é real de todas as maneiras, que existe em todos os planos, que é lindo de todos os jeitos.
Eu não sei como escrever sobre esse amor que eu sou totalmente inexperiente, eu só sei te amar. 
E te amar é dançar juntinho qualquer tipo de música mesmo você sendo um dançarino pior que eu, é passar tardes deitados na cama rindo de bobagens, é dirigir de madrugada dando voltas e voltas pela cidade jogando conversa fora, é cantar Nenhum De Nós mil vezes sem enjoar, é beber tequila juntos como parceiros indo para uma festa. É assistir House porque eu sei que é sua serie favorita e você assistir Grey's Anatomy em episódios aleatórios só pra me agradar. Te amar é ouvir a promessa fajuta de que você vai assistir todos os filmes de Star Wars e até hoje não viu nada. É aguentar seu pai enchendo meu saco e ver você criar toda uma paciência para aturar minha irmã adolescente. Te amar é brigar e depois ri da briga, é você me chamar de "cabeçuda" e eu te mostrar o dedo do meio, é falar que vamos ser fitness e sempre acabar a noite no McDonalds. 
Te amar é se assustar as vezes com toda essa alegria que você me faz, é ter medo que tudo seja só um sonho e na manhã seguinte você não exista mais pra mim, é não querer ser tão dependente do seu amor. Te amar é te afastar quando tento nos sabotar e você não ir, me vencendo na minha própria armadilha. 
Te amar é amar meu melhor amigo, é amar meu primeiro namorado, é amar meu futuro marido. 
Te amar é tocar na sua mão e sentir um amor reciproco, é ter casa, é ter abrigo, é ter carinho e proteção. É enxergar nos seus olhos nosso passado, passo a passo, todos os momentos em uma linha do tempo, do primeiro "oi" ao primeiro "eu te amo" e ainda sentir aquele mesmo frio na barriga como se fosse a primeira vez de novo. Te amar é enxergar nos seus olhos nosso futuro, é desenhar nossa casa, é pensar no nome dos nossos filhos, é querer noivar, é planejar casar, é estar juntos e ter nossa família. 
Te amar é ter coisas que eu nunca achei que queria, e sonhos que nunca achei que fossem pra mim e querer os piores clichês da vida como se fossem as melhores coisas do mundo.
Te amar é finalmente saber que a realidade pode ser muito melhor que minhas palavras e é não tê-las o suficiente para nos descrever, porque você é um amor que eu nunca vi, que eu nunca senti. É um amor amigo, parceiro, infantil. É um amor companheiro, de todas as horas, de suporte e força.
Amor, eu nunca escrevi nada pra você porque você é meu amor real e eu não sei escrever sobre isso. Mas eu ainda tenho uma terrível duvida: eu preciso saber se você me transformou ou me revelou, porque tudo que eu mais quero agora é você, nossos filhos e uma casa com cerquinha branca.

Por Ridrya Carolin.