sábado, 22 de julho de 2017

Igual a você


"Vocês ainda se falam?"
Essa é a pergunta que mais venho ouvindo nos últimos meses quando alguém cita o seu nome numa simples conversa casual. E é uma pergunta que eu recebia com total estranheza, afinal, você é minha melhor amiga, todo mundo sabe. Então por que do nada começaram a fazer essa pergunta como se algo ruim tivesse acontecido? 
Eu não entendia o proposito daquela pergunta, mas ela me incomodava de uma maneira tão violenta que me machucava. Tudo bem, eu não sou tão tonta assim, eu sei que alguma coisa mudou. Eu sei que estamos mais afastadas que o normal. Você vivia na minha casa e agora faz meses que não me visita. Nos falávamos por mensagem todos os dias e agora você parou de responder as minhas, e quando responde parece que não tem interesse em continuar. Você sempre me marcava em posts engraçados, frases sobre signos, em textos fofos sobre amizade no Facebook e, de repente, você parou.  
De repente, você parou. De repente, você sumiu. De repente, você se mudou. 
De repente, começaram a me fazer aquela pergunta estranha.
De repente, eu comecei a me sentir estranha, te sentir estranha.
De repente tem essa monstruosa distância entre nós que eu não criei, que eu nem mesmo vi se formar. 
E quando eu respondia do jeito mais normal e seguro do mundo "Claro que não", a resposta parecia errada. A pessoa me olhava surpresa, como se estivesse esperando alegações finais, explicações para o que aconteceu. 
Mas eu não sei o que aconteceu.
Aconteceu alguma coisa? 
Até semana passada eu ainda insistia em te mandar mensagem, até cheguei a falar o quanto eu estava chateada com a sua ausência e você pareceu entender. Parecia que íamos resolver o que quer que fosse o problema e voltaríamos ao normal. 
Eu fui uma idiota, né? Você deve até achar engraçado. 
Enquanto eu continuava te considerando minha melhor amiga, você estava aí escondida fazendo coisas que eu não podia saber, mas que todo mundo sabia. Enquanto eu continuava insistindo na nossa amizade, você estava por aí "muito bem acompanhada", feliz da vida sem sentir minha falta. Enquanto eu tava aqui quebrando a cabeça para entender que merda estava acontecendo com você, você estava pelos cantos escuros da rua com esse segredo nojento, dormindo tranquilamente como se não tivesse perdido nada importante. E, talvez, não tenha mesmo. Talvez eu não fosse importante pra você como você era pra mim. 
Mas não foi esse segredo, não foi "ele" que arruinou tudo. Foi você, sozinha e sem ajuda de ninguém. Foi o problema, as desculpas, as mentiras, a distância, a situação que você criou. Foi a escolha que você fez. Você tinha mil escolhas. Você podia ter me procurado, ter conversado, ter esclarecido, ter perguntado, ter se importado. Você poderia ter sido franca, poderia ter sido honesta, poderia ter sido leal. 
Você poderia ter sido amiga. A minha amiga. A amiga que está no porta-retrato que você me deu ano passado, que fica bem ao lado da minha cama. Porque eu teria sido sua amiga, continuaria sendo. Por você, eu entenderia, eu apoiaria, eu ajudaria. 
Você poderia ter me escolhido.
Mas não, você fez todas as escolhas da qual eu não fazia parte. Da qual eu fui excluída, não existia. Você fez a escolha que me tiraria da sua vida. Você fez o contrário do que faria uma verdadeira amiga. Do que eu, no seu lugar, faria. 
Você deixou que eu ficasse sabendo a resposta daquela maldita pergunta dentro de um salão de beleza numa terça-feira qualquer, por meio de comentários e fofocas, como se você fosse só uma mera conhecida de vista.
E lá dentro, me perguntaram de novo: 
- Vocês ainda se falam?
Eu não sei como chegamos até aqui. Foi tão rápido e tão lento ao mesmo tempo. Tão desprezível e doloroso. Tão comum e imprevisível. Eu nunca achei que você seria alguém que eu tivesse que me desfazer, tivesse que esquecer, tivesse que fingir que nunca existiu. Eu não esperava essa dor que você causou, porque eu teria feito qualquer coisa por você. Eu não comecei a te chamar de amiga anos atrás só por chamar, te chamei de amiga porque eu confiava, porque você era minha irmãzinha, porque eu te amava. 
E agora eu me sinto tão estúpida, tão burra. Eu estou a um passo de te odiar e, ao mesmo tempo, não tô pronta pra isso e acho que nunca vou estar. Nunca vou conseguir te odiar. Então, quando pensar mim, quando pensar em nós, quando pensar no antes, quando pensar nos momentos, nas fotos, nos vídeos, nos textos. Quando pensar no que aconteceu, no que você fez, em quem você escolheu, não espere, nem por um segundo, em nenhuma hipótese, que eu seja igual a você. 
- Não. Não somos mais amigas - eu respondi, finalmente sendo atingida pela realidade que eu tanto ignorei. E foi a coisa mais difícil que eu já falei na minha vida.
Quando cheguei em casa, eu tirei todas as nossas fotos do meu quarto e guardei numa caixa. Não tinha mais porque continuar com aquela foto ao lado da minha cama, afinal você já tinha solicitado o fim e só faltava eu assinar de vez o final. 
PS: Eu realmente espero, com todo meu coração, que tenha valido a pena.

Para ler ouvindo: Igual a você - Nenhum de Nós

Por Ridrya Carolin.

terça-feira, 2 de maio de 2017

Ela foi o meu porquê



Você sabe o que ela fez? Claro que sabe. Todos sabem, certo? Todos já trocaram ao menos uma palavra com ela durante as aulas, ou já trocaram um sorriso no meio dos corredores ou já cruzaram o olhar com o dela no refeitório. 
Agora todos vão falar como ela era incrível e ao mesmo tempo perturbada, como ela era intensa e ao mesmo tempo dramática e como ela era cheia de vida e ao mesmo tempo não queria viver. 
Agora todos vão falar que torciam por ela, que gostavam dela. Todos vão falar que a conheciam. 
E todos vão estar mentindo. 
Eles sabem o que ela fez, mas ninguém sabe o porquê. Ninguém sabe o que ou quem ela deixou para trás.
Ninguém sabe o que ela não fez. Mas eu sei, ela não me deixou.
Ela simplesmente decidiu ir e não me deixou fazer e dizer metade da coisas que eu deveria e queria ter feito e dito para ela. Ela simplesmente sumiu e não me deixou vê-la uma última vez, não me deu a chance de fazê-la mudar de ideia, não me deixou chegar perto dela. 
Ela não me deixou ser o cara que ela merecia. Não me deixou ser o amigo que ela precisava. Não me deixou levá-la pra casa quando estava triste e perdida. Não me deixou ser seu travesseiro no quarto escuro para ela colocar a cabeça, chorar e dormir. Não me deixou ser teto para protegê-la da chuva. 
Ela não me deixou saber que aquela vez era a última vez que estaríamos juntos. A última vez que eu olharia no fundo dos olhos dela e veria uma imensidão me levando pela correnteza e me arrastando para o fundo. A última vez que eu iria ouvir a voz alegre dela me chamando por aquele apelido idiota que fazia eu me sentir tão especial. A última vez que eu veria aquela boca abrir aquele sorriso irônico e lindo. Aquele sorriso tão dela, só dela. Ela não me deixou saber que aquela seria a última vez para mim, a minha última oportunidade para falar tudo que eu queria desde a noite que nos conhecemos, para falar tudo que eu não falei na noite que ficamos literalmente sozinhos pela primeira vez quando assistimos o eclipse lunar, para falar o quanto ela ficou maravilhosa com aquele novo corte de cabelo.
Ela não me deixou saber que aquela era a nossa última vez para eu finalmente contar que ela sempre foi o meu porquê. O porquê de eu acordar ansioso todas as manhãs para ir a escola e vê-la mexendo no seu armário próximo ao meu. O porquê de eu ter aceitado continuar trabalhando naquela droga de estabelecimento todas as tardes só para ficar perto dela. O porquê de eu sempre dá uma passada naquela cafeteria, sendo que eu não tomava café, só para fingir que a encontrei casualmente. O porquê de eu ter ido naquele baile, e eu nunca quis ir a nenhum desses eventos, só para ter a chance de dançar ao menos uma música com ela. 
Ela não me deixou falar que ela era o porquê de eu querer viver um pouco mais todos os dias. 
E, que se ela tivesse me deixado, eu teria sido o porquê dela também. Eu teria sido o porquê daquela dor ter passado rápido quando a abracei. Teria sido o porquê daquele choro ter durado menos quando a beijei. Teria sido o porquê daquele sorriso enorme naquele dia ruim quando todos a julgaram, mas eu a entendi. Teria sido o porquê daquela risada esquisita quando todos a ignoravam e eu lhe contava momentos embaraçosos da minha infância. Teria sido o porquê daquele suspiro aliviado quando eu a fiz sentir que ela não estava sozinha. 
Eu teria sido o porquê dela querer viver um pouco mais todos dias, porque eu amava. 
E lá estava ela. 
Tão amedrontada, tão triste, tão calada.
Droga!
Por que ela não me contou nada? Por que ela não me disse o que estava acontecendo dentro e fora do seu mundo? Por que ela só me lançava aquele olhar cheio de significado e não me direcionava nenhuma palavra? Por que ela foi embora sem avisar? Por que me deixou aqui sendo assombrado pela esperança de acordar e vê-la de novo como se nada tivesse mudado? 
Como se tudo não tivesse passado de um sonho ruim?
Eu a odeio por não ter me deixado amá-la.
Eu a odeio por não ter me deixado ser o porquê dela querer ficar. 
Eu a odeio por, simplesmente, ela ter me deixado.  
Se eu pudesse voltar para todos aqueles momentos, eu a faria ver que o meu porquê era tão mais bonito e justo do que os dela. 

Para ler ouvindo: Lord Huron - The Night We Met

Por Ridrya Carolin

quinta-feira, 9 de março de 2017

100%


Sabe do que eu mais sinto falta nessa sociedade moderna, tecnológica, badalada, desapegada e de pessoas emocionalmente desinteressadas? Das amizades 100%. 
Sinto falta da "Sociedade de Mulheres Interessadas em Gargalhadas, Amores e Segredos". É esse o título gravado na almofada que a minha melhor amiga me deu no meu aniversário de treze anos. Naquela época, ela era minha amiga, mas ainda não a 100% e agora, oito anos depois, ela é a 100% sem sombra de dúvida. Porque ela me entende, ela lê minha mente, ela sabe o que eu penso sem eu precisar falar, ela me conhece pelo tom da voz, ela sabe o que eu sinto pelo olhar. Ela entra nos meus esquemas, sustenta minhas mentiras e defende minhas verdades. Ela é parceira de crime, de festa, de domingo a toa, de cinema, de maratona na netflix. Parceira de passar horas no celular pela ligação do Whats's App para não gastar nossos créditos já que eu tô no sul e ela no norte (e, infelizmente, somos pobres. E mesmo que tivéssemos dinheiro, somos "pão dura"). Porque ela mora do outro lado do país e ás vezes ficamos quase um ano inteiro sem nos ver, mas quando finalmente nos encontramos parece que a saudade nem era assim tão grande, afinal era como se estivéssemos juntas durante todo esse tempo mesmo que não fosse fisicamente. Ela conhece todo mundo da cidade onde eu moro, todas as minhas amizades, inimizades e casinhos mesmo sem nunca ter posto os pés aqui. 
Ela é 100% porque temos aquela amizade rara de Meredith Gray e Cristina Yang. "She's my person. She will always be my person" (ela é minha pessoa. Ela sempre será minha pessoa). Nós duas nos consideramos a mesma pessoa. E não porque somos parecidas fisicamente ou em personalidade, pelo contrário, somos totalmente o oposto uma da outra. Somos a mesma pessoa porque nos conhecemos, nos aceitamos e nos amamos de uma maneira que só a própria pessoa é capaz de se conhecer, se aceitar e se amar. Uma começa onde a outra terminar e vice versa. Assim nunca temos fim. Assim somos eternas. E isso nunca se tratou de uma promessa, sempre foi um fato. 
Eu tenho outras amigas assim como ela também tem e isso nunca interferiu na nossa amizade. Mas de uns tempos pra cá, eu tenho parado pra ver que amiga igual a ela eu não consigo encontrar em lugar nenhum. Não que eu queira outra amiga exatamente igual a ela, mas uma amizade igual a nossa. Uma amizade 100%. 
O que me faz pensar que no mundo de hoje não é apenas o amor que se tornou difícil de achar, mas as amizades também.
Eu já perdi as contas de quantas vezes não quebrei minha cara com "falsas amizades" ou com amizades que apenas não eram tão amigas quanto eu. Quantas vezes eu não dei minha confiança para pessoas que não hesitaram em traí-la na minha cara? Quantas vezes eu não desabafei com pessoas que apenas queriam ouvir e não me entender? Quantas vezes eu já não comprei briga de pessoas que no primeiro teste de lealdade não ficaram do meu lado, não lutaram comigo, não lutaram por mim? Quantas vezes eu já não errei e fui julgada com meus erros sendo jogados na minha cara por pessoas que eu dava colo?
Nossa, eu já perdi as contas. 
Foi, então, que eu aprendi que um coração partido por uma amizade dói mil vezes mais do que um coração partido por um amor. E, consequentemente, demora muito mais para sarar e tem efeitos colaterais ainda piores. 
Cadê as amizades de "mexeu com ela, mexeu comigo" ou do "Para senão eu choro também"? Cadê as amizades de festa do pijama, de pipoca, filme e brigadeiro de panela? Cadê as amizades de "Oi. Vim aqui só pra comer"? Cadê as amigas que se chamam dos nomes e palavrões mais feios e mesmo assim não são ofensas, mas um jeito estranho e singular de carinho? Cadê as amigas que contam tudo uma para outra sem ter qualquer receio? Cadê as amigas que jamais ficariam com aquele cara que a outra gosta? Cadê as amigas que respeitam, que valorizam, que cuidam dos sentimentos uma da outra? Cadê as amigas de verdade, as irmãs de mães diferentes, a madrinha dos meus filhos, minha vizinha no futuro, minha médica ou advogada (ou qualquer outra coisa) particular? Cadê "eu sou a Carrie e você a Charlotte" ou "eu sou a Florzinha e você a Lindinha"? Cadê o "lembra daquele dia..."? Cadê o "amigas para sempre"?
Cadê as amizades 100%?
Amiga que é amiga não julga, não mente, não esconde, não diz coisas na intenção de magoar a outra. Amiga não joga coisas na sua cara, amiga aconselha e dá colo porque sabe o quanto aquele erro (que você previu e alertou, mas mesmo assim ela foi lá e fez) tá doendo dentro dela. 
Amiga acredita na outra independente de todas as provas e más linguás apontarem o contrário. Mesmo que ela te pegue na cama nua com alguém e diga que não fez nada, você acredita. Acredita porque ela é sua amiga, porque ela mentiria para qualquer um menos para você.
Hoje em dia o que eu mais vejo é um número enorme de meninas sendo rivais por motivos fúteis, por competições onde ninguém ganha, brigando por homem que não é de ninguém e, principalmente, por um egoísmo sempre sendo posto a frente da amizade. 
Amizade é sobre dividir, compartilhar, saber dar e saber receber. É sobre se entregar, é amar alguém sem ter vínculo sanguíneo, mas vínculo de alma. É sobre ter sintonia, compatibilidade, sincronia. É sobre ter harmonia com uma dose de loucura e caos. É sobre ter metade alguém dentro de si e por isso ser inteiro. 
Mas, acima de tudo, igual a todo tipo de amor, amizade é sobre ter reciprocidade. 
Onde há egoísmo, inveja e vaidade, amizade não floresce.
Amigo é aquele amor que permanece quando muitos outros já foram ou ficaram para trás. 

Para ler ouvindo: Umbrella - Boyce Avenue

Por Ridrya Carolin 

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

As outras


Não existe coisa que machuque mais do que ver a pessoa que você queria fazer feliz, sendo feliz com outras pessoas ou, pior, com uma certa pessoa em particular.
Sendo feliz? Não, se satisfazendo. Ser feliz é um pouco forte demais para um vácuo que só vai ser preenchido momentaneamente, de modo passageiro e fútil. Vai haver sempre essa sensação de desconforto, porque você se achava especial e no fim acabou sendo que nem tantas outras que passaram pela vida dele, que também se achavam especiais e acabaram assim, exatamente como eu estou agora: observando a sua vida por uma janela, escondida na sua sombra, estranhando a sua vida sem mim e me perguntando como, em um piscar de olhos, eu estava bem ali do seu lado e agora estou a uma janela de distância, invisível aos seus olhos e esquecida ao seu querer.
Você deitava no braço dele sem pestanejar? Adivinha, as outras também fazem isso. Ele te abraçava forte por horas? Ele também abraça as outras. Ele também mostra aquelas músicas para as outras, as músicas que um completava o outro quando um começava a cantar do nada. Ele também sorri para as outras. Ele tira foto com as outras. Ele se preenche com as outras. 
Você não era diferente, faz parte das outras. 
Não importa o quanto ele fez você sentir como se fosse especial, como se o carinho fosse único, como se só você fosse capaz de fazê-lo sorrir daquela maneira singular. Não era verdade. Nunca foi.
Sabe aquelas tardes de final de semana que ele passava com você? Ele começou a desmarcar para passar com as outras que apareciam do nada e de repente eram tão mais interessantes que você. E, então, ele foi ao cinema com as outras, sentou nas poltronas no fundo da sala, as mesmas que ele sentava com você, e ele segurou a mão delas, elas deitaram no ombro dele, eles dividiram um doce, a pipoca, o refrigerante, os beijos. Logo a sua casa era só uma casa para onde ele iria quando não tivesse nada marcado com as outras, porque você era algo que estaria disponível quando nenhuma delas estivesse.
Mas não é culpa dele ter esse "algo diferente", que chama atenção aonde quer que passe. Ele não pode evitar. Você não conseguiu evitar. Se nem você conseguiu, imagine as outras que são tão humanas quanto você.
Mas calma, não é culpa dele, é por causa das muitas amizades "verdadeiras" que ele tem, e você ainda é especial. Numa hora ele vai ver, certo?
Não! Não dá para ter calma. Porque você esteve ali quando não existiam as outras. Você esteve ali quando ele precisou, porque as outras estavam ocupadas demais, você tirou do seu tempo para dar tempo a ele. Foi com você que ele se acalmou, que ele descansou e que ele teve para onde voltar. Então, por que você não parece tão suficiente quanto as outras? 
Na verdade, por que existem as outras? 
Por que? Porque ele é tão mais inseguro que você. Ele precisa, ele tem a necessidade, de ter mais de uma por perto. Assim ele não fica dependente de apenas uma pessoa. Assim ele não se apega a nada e nem a ninguém. Assim ele não constrói lembranças sólidas. Assim ele não se envolve, não se prende, não se apaixona.
Enquanto isso, você fica quieta no seu canto, olhando da janela, afinal você não pode fazer nada. Não pode fazer "mais nada", porque tudo que estava ao seu alcance você já fez. Quem é que vai dizer o contrário? Quem é que vai negar que você era diferente, que você era tudo que ele não conseguia ver? 
Sabe, você poderia jogar mil coisa na cara dele, poderia dizer as verdades que ele ignora, poderia gritar os palavrões que estão entalados na sua garganta. Mas, não. Você não vai fazer nada. Não vai demonstrar nada. Não vai provar nada.
Afinal, quem tem que perceber que você não é como as outras, é ele.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

O dia em que eu dispensei o amor


- Você não quer namorar?
Ana me perguntou num tom carregado de algo mais que apenas surpresa, talvez choque, espanto e, com certeza, estranheza. Ela continuou me olhando, piscando várias vezes e mais rápido que o normal e com a boca entreaberta como sempre faz quando algo a surpreende ao extremo.
- Você...V-O-C-Ê não quer namorar? - ela perguntou mais uma vez ainda sem acreditar. - Você sempre diz que está há vinte anos procurando um namorado e quando acha um, você não quer? 
Tudo bem. Essa parte dos "vinte anos" aí é uma brincadeirinha dramática, até porque eu tenho vinte anos e é biologicamente impossível que eu já quisesse encontrar o amor da minha vida muito antes de começar a vida, não é? Ou não, vai ver eu já era louca antes mesmo do meu cérebro está completamente formado. 
A questão é que a Ana tem razão. O que há de errado comigo? Eu sempre fui pra namorar, sempre quis ser de um cara só, sempre quis ter alguém. Sempre fui aquela que vê romance onde não tem, que idealiza o que é difícil de acontecer, que se acha capaz de transformar um cafajeste em príncipe. 
Eu sempre fui uma romântica incorrigível.  
Assumidíssima e nunca tive vergonha disso, nem mesmo nos tempos de hoje onde amor é quase uma utopia. 
Agora, olhando para cara da Ana, minha amiga da vida toda, eu tinha certeza de que ela estava pensando a mesma coisa que eu. Ela me olhava como se estivesse diante de uma louca, uma criatura bipolar, uma desconhecida ou pior, uma nova versão de mim de Áries ou Aquário. Mas, não, eu não era uma nova pessoa. Eu continuava a mesma, talvez um pouco mais cansada e desacreditada, mas ainda a mesma. Eu não tinha virado as costas para o amor, para o meu lado romântico. Eu não tinha dado a doida e me revoltado com o mundo. Nem estava planejando criar uma ditadura de mulheres onde os homens seriam escravos. Não. Eu estava de boa, em estado de dormência, no auge da minha preguiça. 
Foi, então, que eu entendi que o amor tinha saído de cena pra mim. 
Inesperadamente, sem pretensão nenhum, de modo natural eu tirei o foco do amor. Foi coisa de tempo para conseguir e mais tempo ainda para eu me tocar que, pela primeira vez, eu não queria o amor no momento. Até mesmo os livros que eu andava lendo ultimamente não eram romances, eu tinha trocado a Patricia Cabot e a Julia Quinn por Stephen King ou pelas aventuras do Percy Jackson. Eu estava acordando e dormindo sem pensar em ninguém. Estava indo as festas só para dançar e não para ver Fulaninho. Eu estava livre de pensamentos, livre de lembranças, livre de sentimentos. Eu estava cheia de indiferença e cheia de mim. 
Eu não queria o cafajeste e nem o príncipe. Não queria namoro e nem as ficadas casuais. Não queria mensagens e nem telefonemas. Eu não tinha e nem queria ninguém. 
Eu não queria nada. Queria apenas a mim, me pertencer, me namorar, me amar. Ficar sozinha comigo. 
Essa era eu, vazia de alguém e cheia apenas de mim. 
No momento, eu era assim. As portas fechadas e o coração vazio. E não porque alguém me magoou, não porque eu me revoltei, não porque eu quis mudar. Nada disso veio de alguém, nenhum terceiro interferiu, não havia responsáveis. Havia apenas a mim, veio de mim. Eu não estava com o coração partido, pelo contrário, meu coração estava tão inteiro que se tornara autônomo. 
Sabe, eu ainda quero o amor. Não consigo imaginar o dia que não vou querê-lo, mas no momento eu deixei o amor para outra hora. Não porque eu quis, planejei ou me obriguei, mas porque assim aconteceu. O foco mudou, a cena pausou, uma hora passou e a outra hora avançou. E eu nunca me sentir tão cheia estando vazia. Tão completa estando sozinha. Tão satisfeita apenas estando, apenas sendo, apenas indo. 
A Ana entendeu quando eu finalmente encontrei palavras para me explicar. Ela sempre me entendia. 
- Sabe o que a gente devia ir fazer agora? - ela perguntou, indo pegar as chaves do carro. - Passar no mercado e comprar uma Jurupinga.


Por Ridrya Carolin

sábado, 21 de janeiro de 2017

Pessoas de Sombras


Bati a porta do banheiro com força, causando um barulho estrondoso que, por sorte, foi abafado pela música alta que alcançava todos os cantos da casa. O banheiro era o lugar mais silencioso, o único lugar onde eu podia ficar sozinha e sei lá, chorar? 
O que uma pessoa que saiu de casa para ir a uma festa faz sozinha trancada no banheiro chorando? O óbvio para essa pergunta é: com certeza ela terminou com o namorado ou pegou o namorado com outra ou o cara com quem ela ficava tava dando em cima de outra. Provavelmente é isso que aquelas garotas desocupadas que cruzaram comigo nas escadas e me viram correndo para o banheiro estão fofocando uma para as outras. Porque é isso que elas fazem, que todos fazem. Falam de você, inventam coisas e espalham mentiras. 
Soltei a respiração, mordendo forte os lábios para não chorar. Joguei meu cabelo para trás e me olhei no espelho. Eu não sabia dizer quem era a garota no reflexo, não sabia descrevê-la, não sabia o que achar dela. Isso era um problema. Eu deveria conhecer aquela garota melhor do que qualquer um. Eu deveria entendê-la de um jeito que ninguém seria capaz. Eu deveria dizer a ela o que fazer, dizer que ela não está sozinha, mas ela não acreditaria em mim. Ela estava apagada, totalmente sem luz. Ela era uma sombra carregada de palavras negativas, definições falsas e julgamentos injustos. Ela andava ouvindo vozes erradas e se esquecera da sua. 
E eu me esqueci de mim. 
Durante um ano inteiro, eu tentei provar pra todo mundo que eu era uma pessoa boa, tentei não ser alvo de fofocas, tentei não ter inimizades com ninguém. Eu tentei provar e dar o meu melhor, mas nada disso adianta. As pessoas carregadas de maldade não enxergam bondade em ninguém, porque elas a desconhecem, porque não são capazes de tanto, porque não faz parte da natureza delas. As pessoas não querem saber o seu lado da história, não querem saber da verdade, não querem saber se você está bem. Algumas até querem te ver feliz, mas nunca melhores do que elas. Não ver maldade sempre foi o maior dos meus defeitos e, por não conseguir vê-la com os olhos, quase sempre eu a sentia na pele. 
Eu demorei tanto pra entender, mas agora eu sei. Eu não preciso provar o meu valor para ninguém, eu tenho que me valer para mim mesma. Eu não preciso dar o meu melhor para os outros, eu tenho que ser o melhor para mim. 
Porque a minha luz não vem da opinião alheia, não vem dos rótulos que você me deu, não vem das fofocas que Fulana inventou e Cicrano repassou. Minha luz vem do que eu acho, do que eu acredito, dos meus pensamentos, dos meus sentimentos, do meu conhecimento. Vem dos que me conhecem e me amam, vem dos amigos que me defendem, das minhas falhas e conquistas, da minha voz, da minha opinião sobre mim mesma.
Minha luz vem de dentro para fora. Vem da minha alma, do meu coração, do meu eu lírico, vem de mim. E não de fora para dentro. Não do que falam de mim, não do que inventaram, não do que difamaram íntima e publicamente, não do que você ouviu das garotas na esquina e dos caras no buteco, não do que invejaram. A minha luz não vem da maldade que espalham, vem da bondade que me resgata e me torna superior a tudo que tenta me apagar.
Eu demorei, mas finalmente eu consegui enxergar que a luz em mim vem dos meus olhos. Vem de como eu me enxergo. Vem do meu reflexo. Vem da minha companhia quando estou sozinha. Vem das minhas palavras quando escrevo. Vem do que eu sou, tento e quero ser. 
Minha luz vem apenas de mim. 
Com os olhos fixos no espelho, eu avaliei a garota a minha frente mais uma vez e finalmente eu descobri que a opinião dela sobre mim é a única que eu devo ouvir. 

Lembre-se:"Pessoas de Sombras" (como eu gosto de chamar aquele tipo de gente que suga tua luz) não conseguem apagar quem nasceu para ser Sol. 

Para ler ouvindo: Imagine Dragons - It's Time

Por Ridrya Carolin