quinta-feira, 28 de julho de 2016

Indefinidos


Eles não eram um casal.
Disso todo mundo sabia, mas ninguém entendia. Não havia um meio certo para explica-los ou uma única palavra para defini-los. Eram felizes demais para serem namorados e estavam juntos demais para serem só amigos. A verdade é que eles se davam bem demais para serem qualquer coisa. Era até mesmo difícil de saber se realmente gostavam um outro, pois pareciam não se importar com  a monogamia ou com todo o drama que sempre surge entre duas pessoas que se envolvem. 
Eles curtiam sair, curtiam ficar, curtiam a companhia um do outro quando se encontravam. Eles se curtiam. Sem compromisso, sem rótulos, sem dramas, sem clichês. Eles não davam satisfação um para o outro e nem para os outros. Não exigiam, não insistiam. Ele viviam. O momento, a madrugada, a balada, os imprevistos, o sábado a noite. 
Eles eram namorados dentro do carro naquela rua deserta e amigos no vai e vem da rotina. Eles eram de boa e estavam de bem. Eles eram uma incógnita para os desocupados, assunto para os fofoqueiros e incomodo para os invejosos. 
Eles eram indefinidos. 
E foi assim, devagar e sem pretensão, que o casual virou frequência, a conveniência virou vontade e o descaso virou importância. Foi natural e divertidamente que "os dois" no individual virou "os dois" no plural.
"Meus amigos vão fazer um churrasco e jogar truco. Vamos? Vamos!"
"Vou chamar minhas amigas para comer uma pizza aqui em casa. Traga algum amigo seu e venha. Vou!"
"Vai ter uma festa sábado. Vamos? Vamos!"
"Hoje vou sair só com meus amigos. Vai!"
"Hoje é o dia das meninas. Se divirta!"
Eles não se importavam de tomar uma cervejinha sozinhos numa quarta a noite no bar do seu Mendonça, de sentarem na frente da casa dela para jogar conversa fora, de irem numa reunião na casa de algum amigo dele onde só ia ter homem, de irem comer sushi na casa de alguma amiga dela onde a maioria das "amigas" eram tudo fura-olho ou de irem numa festa com um monte de gente que os dois conheciam muito bem o tipo. Eles não se importavam com os outros, eles se importavam de estarem juntos, mesmo que não fossem no mesmo lugar. 
Eles eram e continuavam sendo indefinidos.
Mas davam certo. Sem o menor esforço, sem criar complicações, sem levar a sério brigas bobas, sem dar ouvidos a terceiros, sem cobranças e nem desconfianças. 
Eles bebiam juntos, dançavam juntos, saiam juntos, se queriam juntos, se amavam juntos. 
E sabe por que dava tão certo? 
Porque eles não eram apenas solteiros, amigos coloridos, ficantes ou namorados. 
Eles eram, acima de tudo, parceiros. 
E era essa parceria que os definia. 

Por Ridrya Carolin

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Acabou



Acabou.
Finalmente acabou.
E não graças a você. Não graças às suas atitudes de moleque, não graças a sua covardia, ao seu egoísmo e a sua falta de carácter. Isso apenas me ajudou a acelerar o processo que já deveria ter obtido sucesso há tempos, desde quando você se escondeu no silêncio, desde quando sua máscara caiu.
Acabou porque finalmente eu parei de ter pena de mim e passei a ter pena você. Afinal, quem saiu perdendo aqui foi você. Você que perdeu meu respeito e minha admiração. Perdeu uma grande e verdadeira amiga. Mas acima de tudo, perdeu a chance de ser amado. E chances assim não aparecem a todo tempo, não aparecem para qualquer um. Não é toda mulher com capacidade (ou burrice o suficiente) igual a mim para conseguir ver por de trás de um moleque, um homem.
Então, eu parei. Parei de pensar, parei de analisar, de tentar entender, de buscar respostas, de formular teorias, de exigir explicações. Eu simplesmente parei e essa foi a melhor atitude que eu já tomei. Você não é um caso a ser estudado, você não é um bom motivo para eu perder meu sono e muito menos meu tempo.
Você é um caso perdido que não quer ser encontrado.
E sim, nessa história sem pé nem cabeça, sem começo e nem fim, sem sentido e nem lógica, eu também saí perdendo. Não só meu tempo que foi perdido e minha energia que foi gasta a toa. Eu perdi a parte de mim que queria se entregar, que queria acreditar. Perdi aquela parte que se importava, a parte que era primavera e florescia para a pessoa errada. 
Agora, aqui dentro, é tudo inverno. É tudo caos e gélido.
E, infelizmente, essa parte que é inverno, talvez vire nevasca para a pessoa certa.
Finalmente acabou porque eu me livrei de você e libertei a mim.
Diferente do conto de fadas, a fera não virou príncipe, o meu beijo não quebrou a maldição do sapo e com certeza o moleque não virou homem.
O problema já estava explícito desde o começo: eu era mulher de mais para um homem de menos.

Para ler ouvindo: Acabou - Roberta Campos (aperte em cima para ouvir a música)

Por Ridrya Carolin

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Ausência



Nos finais de semana a galera tem o costume de se reunir na praça para comer um lanche, beber e jogar conversa fora. Eu não estava muito afim de sair está noite. Tinha muitas coisas importantes para fazer como, por exemplo, começar alguma serie adicionada recentemente no catálogo do Netflix ou continuar a minha leitura da semana. Mas depois da insistência constante da minha amiga (que se resume em: umas dez mensagens, quinze áudios e a aparição repentina e inesperada na porta da minha casa) acabei deixando meus planos de lado e sai. 
Não deu outra. Sabe quando você chega no lugar e pensa "Droga! Não deveria ter vindo."? Pois é. A gente nega, se engana, ignora, mas lá no fundo aquele pequeno instinto que te pede para não sair de casa está sempre certo. 
Eu nem sei direito como aconteceu. Foi tão rápido. Numa hora a conversa na rodinha de amigos era sobre o jogo do São Paulo que iria ter na quarta-feira; e na outra, seu nome foi mencionado. Tá bom. Até que fazia sentindo falarem de você, afinal você é são-paulino doente. 
Então lá estava eu, sentada num canto, quieta, ouvindo a conversa. Ouvindo seu nome, ouvindo histórias que você fizera parte, ouvindo sobre o namoro que você reatou há pouco tempo. Eu me encolhi ainda mais no canto. Sim, teu nome ainda era música para os meus ouvidos. E não, ele ainda não soava e acho que nunca soaria com indiferença para mim. A indiferença que eu tanto queria sentir pela tua existência, pelas novidades da tua vida e pelas pessoas que faziam parte dela.  
Para minha sorte, ninguém sabia que por um curto período da minha vida você foi minha vida. Ninguém notou quando eu fechei a cara e me afastei um pouco. Fiquei um tempo ali na parte mal iluminada de trás da praça, encarando a rua que tantas vezes já me levou até a tua casa. Seria loucura minha desejar que o antes se transformasse no agora? Me perguntei, fazendo um grande esforço para não começar a chorar e brigando comigo mesma por essas idiotices ainda terem um efeito devastador sobre mim. 
Droga! Depois de tanto tempo, de tantas mudanças, de tantas voltas que o mundo deu, você ainda tinha efeito sobre mim. Sei lá, eu só achei que, a está altura da minha vida, eu já fosse forte o suficiente para não sofrer mais por coisas idiotas ou por pessoas que não me merecem. Só achei que meu coração já fosse um pouco mais resistente as pauladas que leva constantemente. Só achei que eu já fosse um pouco mais imune a você. 
E, mais uma vez, lá estava eu, deixada com a tua ausência como companheira. Agora, tenho que explicar para tua ausência que eu te perdi sem nunca te ter. Tenho que fazê-la se ausentar também. Tenho que fazer da tua ausência uma aliada porque tê-la como inimiga me mata. Espero que ela seja rápida e clara, que leve meu recado para a moça que agora te tem, que eu espero que ela te faça feliz. Espero que ela te mantenha perto e que te cuide, porque é isso que você merece. Espero que ela nunca procure pela tua ausência, porque está ficou para mim. E, espero que você saiba, que bem lá no fundo, onde não bate luz, eu estou feliz por você. 
Olhei as horas no celular, já era um pouco mais de meia-noite. Escondida, sem me despedir de ninguém, fui embora pela longa rua deserta. O bom de morar numa cidade pequena são esses momentos em que você pode andar sozinha por ai, vagando sem rumo pelas ruas vazias e um pouco escuras. E quantas vezes eu já não tinha feito isso, saído de alguma festa ou da casa de algum amigo, para andar acompanhada de meus pensamentos na volta para casa. Já tinha até perdido as contas. 
Ao dobrar a esquina, a uns dois quarteirões da rua da minha casa, eu parei de repente. Parei porque um pouco mais adiante estava a tua casa; os muros amarelos desgastados, o portão de barras brancas e o carrinho velho que seu pai te deu de presente aos dezoito anos estacionado na frente. A tua ausência me levara direto pelo caminho que eu vinha evitando desde a tua partida. Foi então, que eu me dei conta de que eu não queria voltar para casa, eu não queria viver no agora. Eu não queria morar e nem viver num lugar onde não existia você. Onde só existia eu e o que a tua ausência me trouxe.
Você se foi e me deixou no antes, da onde eu ainda não sei sair.
Meu bem, devolva-me meu endereço. Devolva-me minha rua. Devolva-me minha casa. 
Não quero mais fazer da tua ausência minha morada. Você se foi e não levou consigo tudo que era seu, deixou coisas suas em mim. E eu fiquei aqui, com o antes ainda presente, com as suas coisas misturadas as minhas, com tua lembrança fazendo morada em mim.  
Você se foi, mas eu ainda moro no antes. Lá é o único lugar onde existe nós dois.  

Por Ridrya Carolin

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Me deixe cair


Aqui estou eu mais uma vez na frente do computador, encarando a lauda em branco e tentando, desesperadamente, organizar o turbilhão de pensamentos que estão gritando na minha cabeça. Aqui estou eu mais uma vez chorando e me condenando por chorar. Aqui estou eu tentando respirar e me sentindo ainda mais sufocada. 
Aqui estou eu...tentando, pensando, chorando, sentindo e tentando ainda mais. 
E cheguei a conclusão de que não dá mais. Eu não consigo mais. 
Eu tô cansada, desgastada, destruída. Preciso de tempo, de espaço, de um analgésico. 
Hoje, eu cheguei ao meu limite. Um ponto em que ou eu choro tudo que tá preso aqui dentro ou me afogo nas minhas próprias lágrimas. Ou eu me calo para sempre ou eu grito tudo para fora. Cheguei no extremo em que eu digo para mim mesma "me deixe cair". Eu preciso cair, sentar no chão, abraçar os joelhos e chorar. As minhas pernas bambas, o meu corpo trêmulo, a minha cabeça latejante já não me aguentam mais em pé, então me deixe cair. 
E tá tudo bem, sabe. Não tenha vergonha. Não procure explicações, nem soluções. As coisas são assim mesmo. Ás vezes a gente chora, não porque doeu, não porque acabou, mas porque de novo não deu certo.
Você não precisa ser forte todo dia. Descanse um pouco. Descanse a cabeça, dê uma pausa nos pensamentos. Descanse os lábios, pare de sorrir forçado. Deite na cama, ponha a cabeça no travesseiro, feche os olhos e chore. Chore tudo que tiver de chorar. Deixe a maré acalmar, a chuva passar. 
Permita-se cair.
Como você mesma costuma dizer "do chão não passa". Então, caia. Fique ai no chão caída o tempo que precisar. Não é feio desabar. Às vezes, a gente precisa dos momentos de franqueza para encontrarmos nossa força. E, moça, você é tão forte. Olha só você, tá aqui quieta no seu canto se permitindo ser fraca. Tem maior prova de força do que assumir sua fraqueza? Do que assumir e aceitar essa dor? Teu coração é bonito porque ele sente. Então, sinta. Sinta tudo que vier.
Sinta, chore, grite, caia. 
Extrapole, desabe. 
Amanhã você se levanta, mas hoje apenas caia. 

Por Ridrya Carolin

domingo, 3 de julho de 2016

O seu cantinho



De novo, eu vou tirar os olhos da televisão e olhar para o celular em cima do sofá ao meu lado. Vou apertar o botão inicial e mesmo sem ter nenhuma notificação interessante eu vou fuçar o Facebook, vou ver as três primeiras fotos que aparecem no meu Instagram e finalmente vou dar só uma olhadinha no WhatssApp para checar o que o pessoal está falando no grupo da festa que vai ter semana vem ou para confirmar se as meninas vão mesmo fazer algo hoje a noite. Apenas isso, ok? Eu não vou ficar olhando a sua foto de perfil, que afinal de contas você mudou ( e eu gostava mais da antiga), e muito menos o horário da última vez em que você esteve online, que foi há uns vinte e quatro minutos atrás. 
Não. Relaxa. Eu não sou uma louca obsessiva.
Juro. Não sou. 
Droga.
Quem é que eu tô tentando enganar?
Eu não tô nem ai para o que o povo anda compartilhando no Facebook, nem sei quem são aquelas pessoas nas três fotos que eu vi no Instragram e tô pouco me lixando para o que estão falando naquele grupo do WhatssApp que mais da metade dos participantes eu não conheço. 
Eu fico encarando esse celular de minuto em minuto porque estou ansiosamente ( e desesperadamente) esperando você vir falar comigo. Não tem sensação melhor no mundo do que bater o olho no tela do meu celular e ver seu nome ali. Toda vez que vejo aquele "Oi", um pequeno sorriso se forma no meu rosto. Até já sei de cor o seu jeitinho sem graça de puxar conversa. "Tudo bem?" ou "O que faz de bom?". E eu preciso confessar, eu adoro. Adoro o fato de que pelo menos num segundo rápido do seu dia, você lembrou de mim, você teve vontade de falar comigo. Mas adoro ainda mais o fato de eu existir na sua vida. Nem que seja de modo superficial, de um jeito insignificante. Mesmo que o lugar em que habito seja pequeno e pouco valorizado, eu adoro estar neste cantinho da sua vida. Adoro ter este cantinho. 
É pouco, eu sei, mas eu gosto. Porque apesar de ser pouco, é alguma coisa. Pequena e boba, mas é.
Estamos na primeira semana do mês de julho e faz um pouco mais de dois meses que estamos conversando quase todo dia e nos vendo quase todo final de semana. Talvez você nem tenha se dado conta, mas você tem um cantinho na minha vida também. Um cantinho só seu, que me faz pensar em você pelo menos umas duas vezes no dia, que me faz me importar se você passou no exame daquela matéria super difícil da faculdade, que me faz desviar do meu caminho habitual na volta da academia só para ver se seu carro está na garagem. Um cantinho que me faz feliz por saber que quem agora o ocupa é você; e que me faz triste por saber que talvez amanhã você já não o ocupe mais e ele volte a ficar vago.
Olhei de novo para o meu celular. Nenhuma mensagem sua. Você sumiu. Desde quinta não nos falamos mais. E, eu sei, eu não deveria estar ligando. Afinal, não temos nada mesmo. Você deve estar em algum bar na cidade vizinha bebendo com aquele seu amigo palhaço ou deve estar se livrando da tensão com alguma "louca aí". Ou talvez, na pior das hipóteses, tenha voltado de novo com a biscate da sua ex.
A questão, é que eu ainda não aprendi a lidar com os seus sumiços. Ainda não aprendi a entender o significado deles. Eu ainda não tô preparada para o seu oi se tornar um adeus. Não tô preparada para te ver indo embora...de novo. 
Droga, você vai fazer isso de novo. 
Você vai sumir. 
Nos últimos cinco anos, o acaso fez com que nos perdêssemos três vezes e nos encontrássemos duas. E na última vez que você sumiu assim do nada, sem dar uma satisfação, eu fiquei sozinha tentando não sentir tanta falta daquele cantinho. Eu fiz de tudo para me desapegar tão rápido quanto me apeguei. E quando eu finalmente consegui, quando eu finalmente tinha colocado outro no cantinho que era seu, você voltou. Mais uma vez você voltou. Todo decidido, livre e com mil promessas para cumprir. E adivinha só, mais uma vez eu te dei uma chance e mais uma vez você sumiu do nada, sem nem ao menos dizer um "Tô vazando, gata".
Soltei uma risada irônica, o corpo cansado e os pensamentos a mil. Olha só, a gente se perdeu de novo. E desta vez, eu espero que não nos encontremos mais. Eu não ainda não aprendi a lidar com as suas voltas. Ainda não aprendi a entender o significado delas. Eu ainda não tô preparada para te encontrar numa festa qualquer por acaso, logo quando eu menos espero, e me render àquela repentina saudade de te ter no meu cantinho. Não tô preparada para te ver voltando...de novo. Porque eu nunca sei se abro o coração ou se largo mão. 
O problema desse seu vai e vem é o terremoto que cria em mim. 
Você não sabe, mas toda vez que você se aproxima, eu me apaixono de novo. Não só por você, antes fosse. Talvez seria até mais fácil de lidar. Mas eu me apaixono ainda mais pela ideia de dar certo, me apaixono pela ideia de "nós". E é difícil dar um fim ao que nunca teve um começo. É difícil se desapaixonar de um sonho tão bonito. 
E é mais difícil ainda ver o seu cantinho vazio. 
De novo, eu vou indo. Vou te largando, te esquecendo, vou de cantinho em cantinho até voltar para a casa num sábado a noite. Vou ouvindo seu nome em conversas avulsas, vou me apaixonar por algum babaca e quebrar a cara. E, então, entre encontros e desencontros, você vai aparecer de novo. 
Não foi dessa vez, talvez não seja na próxima e nem na seguinte. Mas vai chegar o dia, em que você irá vir de mansinho, todo decidido, livre, com mil promessas para cumprir e vai voltar para o seu cantinho.
E quem sabe, desta vez, você resolva ficar. 
Mas, por enquanto, era apenas eu, mais uma vez, ouvindo do seu silêncio um adeus.  

Para ler ouvindo: Little Do You Know - Alex & Sierra

Por Ridrya Carolin 

sexta-feira, 1 de julho de 2016

O quebra-mola


Eu já sabia o que ele ia falar no instante em que descemos a esquina e as grades de ferro desgastadas do portão da minha casa ficaram a vista. Ele iria contar a velha história de quando caiu de bicicleta no quebra-mola da rua em frente de casa. 
E, de fato, eu não errei. 
Lá estava ele contando aquela história e lá estava eu ouvindo-a como se já não a conhecesse. 
No final, eu sempre dizia ''É, eu sei. Você já me contou.'' e revirava os olhos de saco cheio. Então, ele se tornava um grosso arrogante e eu uma chata rabugenta. E, de repente, de novo, estávamos brigando, porque era isso que sempre fazíamos. 
Não brigávamos apenas duas vezes na semana, brigávamos todo dia. Por tudo e por todos. Pelos amiguinhos idiotas dele que eu não suportava, pela sua falação inconveniente bem na hora mais importante do filme, pelas garotas exibidas que ele ficou antes de mim, pelo tanto que eu extrapolava na bebida nas festas, pelo meu vestido preferido (que era "curto demais" dizia ele), pelo corte horroroso que ele fazia no cabelo de três em três meses e por endeusar a droga daquele carro velho que ele dirigia pra cima e pra baixo pela cidade.
Era um hábito repulsivo. 
Dois namorados brigando no meio da rua por um motivo imbecil. 
Algo comum, típico, clichê. Algo que nos cansava, nos afastava e aos poucos nos separava. 
Éramos o que estávamos nos tornando. Tão cheios de si e tão vazios um do outro. 
Um mês depois terminamos. Não dava mais para mim e ele já não tentava mais. Eu fui embora e ele não pediu para eu ficar. Eu sai da vida dele e ele não me puxou de volta. Eu decretei o fim e ele simplesmente o aceitou. 
Eu sabia que estávamos no fim, mas, na verdade, eu sentia como se de novo estivéssemos no começo. Bem antes de tudo, bem antes de "nós", pois no fim voltamos ao nada porque cansamos de tudo.
Não éramos mais os mesmos ou talvez não queríamos mais ser. Não éramos mais aquele casal que deu seu primeiro beijo na noite de Ano Novo, a exatamente uma da manhã. Você não era mais o cara que vinha todas as sextas depois da faculdade na minha casa e que ficava conversando comigo até as seis da manhã no banquinho da calçada com cobertas por causa do frio. Eu não era mais a garota que você ficou por sete meses na frente de casa naquele banquinho duro e frio e que você namorou por mais sete meses. 
Éramos o que havíamos nos tornado. Tão cheios de um outro e tão vazios de si. 
No sábado a noite, eu voltei sozinha da festa caminhando pelas ruas escuras e silenciosas da cidade. Desci a esquina de casa e lá estava ele, o velho quebra-mola. Mas desta vez, você não estava comigo para me contar aquela história imbecil. 
Então, eu chorei. 
Chorei porque eu precisava que você viesse contá-la para mim. Chorei porque senti saudades de tudo e porque agora não éramos nada. Chorei porque eu queria brigar, mas não com qualquer um ou por qualquer motivo. Eu queria brigar com você por causa da merda daquele quebra-mola. 
E como se já não bastasse o choro, as três doses de tequila latejando na minha cabeça e o frio desnecessário do mês de junho, um carro entrou na rua deserta e parou logo atrás de mim.
Droga. Eu conhecia muito bem aquele Celta preto com um pequeno amassado no capô da frente. 
Ele desligou a luz alta e fez sinal para eu entrar no carro.
E eu fui. 
Depois de quatro meses separados, inúmeras provocações, vários desentendimentos ( e alguns PTs em festas), estávamos ali voltando de novo um para o outro.
Éramos apenas o que sempre fomos, um do outro. 
Mas a gente é assim mesmo. Ás vezes um triângulo, com alguém no meio sempre nos separando. Ás vezes um quadrado, brigamos e vai cada um para o seu lado. E sempre um círculo, dando voltas e voltas, de começos a recomeços, mas nunca chegando no fim. 
Antes de parar na frente da minha casa, o carro deu um solavanco ao passar pelo quebra-mola no meio da rua. Nós dois rimos e ele me olhou de um jeito que eu conhecia muito bem e que me fez ter certeza do que estava por vir.
E, de fato, eu estava certa. 
Ele falou logo depois "Eu já cai de bicicleta nesse quebra-mola uma vez''.

Por Ridrya Carolin 

Para ler ouvindo: Fire meet gasoline - Sia